Quem não suspeitou da desculpa que Leila (Fernanda Machado) daria ao ter
fotos suas com Thales (Ricardo Tozzi) reveladas para Nicole (Marina Ruy
Barbosa), às vésperas do casamento que ela armou entre a milionária
moribunda e o próprio namorado, como estratégia para abocanhar a herança
da pobre menina rica? Pressionada pela ex-governanta de Nicole, a quase
histérica Lidia (Angela Rebello), Leila se saiu com a desculpa, já
usada tantas vezes na ficção, de que havia visitado Thales a pedido do
próprio, que armava uma
surpresa para a noiva. Ok, novela tem
lugar-comum. Mas, quando fica muito previsível, perde a capacidade de
surpreender e emocionar. A não ser que a emoção buscada seja a
raiva.
Também é difícil se emocionar com o tom exagerado de alguns personagens.
Ao lado da médica amalucada Glauce (Leona Cavalli), que fala
sussurrando e parece sempre prestes a sacar uma seringa da bolsa, a
ex-governanta Lidia compõe o grupo das personagens à beira de um ataque
de nervos. Quase histérica, ela gesticula nervosamente e vive afobada,
convicta de que as suas teorias sobre a traição da ambiciosa Leila,
apesar das poucas provas que reúne, são a verdade absoluta e confirmada
por Deus.
Ok, uma novela pode ser fantástica como
Saramandaia, que ganhou nova versão na faixa das 23h da Globo. Mas o texto tem de ter coerência interna. No caso de uma novela como
Amor à Vida,
que se propõe ao realismo, não faz o menor sentido colocar um
personagen falando sozinho, porque ninguém faz isso na vida real. Pois a
cena aconteceu, entre outras vezes, no capítulo da última terça-feira, 6
de agosto. Em uma conversa com Edith (Bárbara Paz), Aline (Vanessa
Giácomo) descobre que César (Antonio Fagundes) quer a estilista de volta
à sua casa não apenas para fingir um casamento de fachada com Félix
(Mateus Solano), mas também porque os dois têm um grande segredo em
comum. Aline se aproximou do médico e se tornou sua amante para vingar a
própria família -- ela é sobrinha da
mãe biológica de Paloma,
Mariah (Lúcia Veríssimo) -- e obviamente quer saber de que segredo se
trata, porque pode se valer dele contra César. Edith se nega a revelar
e, depois de se despedir e sair de cena, Aline aparece falando sozinha.
"Preciso descobrir qual é esse segredo." Artificial e desnecessário.
A novela menoespreza a inteligência do espectador em lances como esse.
Ordália (Eliane Giardini) convence o filho Bruno (Malvino Salvador) a
deixar a filha adotiva Paulinha (Klara Castanho) encontrar sua
ex-namorada Paloma (Paolla Oliveira). O argumento é de que ele deve
pensar na "
felicidade" da garota. Bruno responde. "Está certo. Se é para a minha filha ser
feliz assim, que ela seja
feliz."
Na sequência, Bruno e Paulinha se encontram. Ela corre, abraça o pai e
declara, em uma repetição irritante: "Ai, pai, estou tão
feliz". É tipo novela
for dummies.
Outro recurso muito utilizado pela trama de Walcyr Carrasco é a elevação
brusca e absurda da temperatura dramática. Na cena em que a médica
Amarilys (Danielle Winits) tem um sangramento e deduz que perdeu o
embrião implantado na tentativa de fazer dela a barriga de aluguel do
casal gay Eron (Marcello Antony) e Niko (Thiago Fragoso), entra uma
música de terror digna de
O Massacre da Serra Elétrica. Parece
que a médica vai morrer. Amarilys se ampara em um móvel do consultório
e, como se tivesse um vislumbre do inferno, repete sem parar: "Ai, meu
Deus, ai, meu Deus". A sequência também é tenebrosa: Amarilys aparece
conversando com Laerte (Pierre Baitelli), o médico responsável pela
fertilização assistida, e, enquanto se imagina dando a notícia a Niko e
Eron, as lágrimas descem e um som como o de uma caixinha de música sobe.
É de causar náuseas. As cenas de Paloma, que não à toa ganhou nas redes
sociais o apelido de Pamonha, são outras trabalhadas no drama. Ai, ai.